O presidente Lula (PT) demonstrou indignação a auxiliares em Nova York ao se deparar com a notícia do impacto das bets nas contas da população mais pobres e alta de endividamento. Ele já cobrou de seu governo a edição, com urgência, de medidas para reverter esse cenário.
O ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias, disse que Lula pediu “urgentes providências” sobre o tema. A pasta é responsável pelo programa.
“O presidente defende que Bolsa Família é para alimentação e necessidades básicas de cada família beneficiária. Pediu urgentes providências”, disse Dias. O cartão do Bolsa Família, que pode ser usado para compras no débito e outras movimentações, como saque do benefício, deve ser vetado para bets.
“A regulamentação das bets, coordenada pelo Ministério da Fazenda e Casa Civil, deve conter regra com limite zero para o cartão de benefícios sociais para jogos e controle com base no CPF de quem joga.”
O monitoramento por CPF está previsto na regulação do setor no Brasil. “Você vai ter CPF por CPF de quem está apostando, tudo sigiloso, mas ele vai abrir essa conta. Vamos poder ter um sistema de alerta em relação às pessoas que estão revelando uma certa dependência psicológica do jogo”, detalhou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, nesta quarta-feira (25).
O chefe do Executivo tomou conhecimento da situação por meio da nota técnica feita pelo Banco Central, que indicou gastos de R$ 3 bilhões em apostas por beneficiários do Bolsa Família somente via Pix e no mês de agosto.
Lula externou a interlocutores preocupação com o impacto das pessoas em situação de vulnerabilidade, inclusive entre adolescentes e jovens.
Quase um terço (30%) dos brasileiros de 16 a 24 anos afirmou já ter apostado, segundo pesquisa Datafolha publicada em janeiro deste ano. O percentual entre os jovens é o dobro da média de 15% para todo país.
As bets são liberadas no país desde 2018, após lei aprovada no governo Michel Temer (MDB). O governo de Jair Bolsonaro (PL) deveria ter regulamentado o mercado, mas não o fez nos quatro anos de mandato – nesse período, as bets tiveram crescimento enorme, sem regras e fiscalização.
Lula tem se queixado de Bolsonaro a interlocutores por ele não ter cumprido o que era previsto pela lei de 2018, que previa a regulamentação em dois anos, prorrogáveis por mais dois anos. Lula relaciona a Bolsonaro o agravamento o problema.
Em 2023, o governo Lula editou uma MP (medida provisória) sobre o tema e, a partir disso, um projeto de lei passou a ser discutido no Congresso e foi aprovado no fim do ano.
A legislação trata dos jogos da chamada quota fixa, em que é conhecido quanto se pode ganhar com a aposta (a partir de resultados de jogo de futebol, por exemplo). A grande mudança na Câmara foi a inclusão de jogos online, onde entram cassinos e outros jogos de azar em ambiente virtual —o que não constava no texto original do governo.
A regulamentação do mercado tem sido liderada pelo Ministério da Fazenda, onde foi criado uma secretaria para cuidar de prêmios e apostas. Os efeitos completos da legalização entrarão em vigor em janeiro de 2025, e o governo conta com grande arrecadação.
Mas, a partir do mês que vem, somente empresas que se cadastraram para serem regularizadas junto à Fazenda serão consideradas legais. Outros sites deverão ser derrubados.
Nos últimos dias, diversos parlamentares apresentaram propostas para mudar o texto chancelado por eles mesmos no ano passado —o que inclui integrantes da base de Lula. Até mesmo integrantes do PT dizem, agora, terem subestimado efeitos negativos e o alcance desse mercado nas contas dos brasileiros.
A reação dentro do Congresso ocorre em meio a denúncias envolvendo bets, o surgimento de dados mais robustos sobre impactos na vida cotidiana e embates de setores como o varejo e o de bancos.
Já há propostas de restringir apostas para quem recebe o Bolsa Família. Dos 20 milhões de beneficiários, 5 milhões fizeram apostas no mês passado, segundo a nota do Banco Central. Desses, 70% são chefes de família, ou seja, quem de fato recebe o dinheiro transferido pelo governo.
Fonte: Folha de S. Paulo