O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) anunciou nesta sexta-feira (5) ter sido escolhido pelo pai, Jair Bolsonaro, para concorrer à Presidência da República em 2026. Com o movimento, o ex-presidente passa a centralizar, da cadeia, o projeto político de parte da oposição, além de frustrar partidos do Centrão, que buscam uma união em torno do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), para enfrentar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Na sexta, dirigentes de partidos como PP, União Brasil, Republicanos e PSD avaliavam que a indicação de Flávio, caso seja concretizada, irá isolar o bolsonarismo, levando essas legendas a adotar a neutralidade no ano que vem.
O entendimento, contudo, é que esse cenário pode ser revertido. Integrantes desses partidos acreditam que Flávio não possui musculatura para decolar em uma campanha presidencial e a iniciativa servirá para testar o sobrenome Bolsonaro na pré-campanha. Essa é a mesma leitura do Palácio do Planalto, que por enquanto comemora a desarticulação da direita.
‘Missão’
Na sexta, a declaração de Flávio ocorreu após o senador relatar a aliados que o pai o convocou, na terça-feira, para disputar o Planalto, em conversa na Superintendência da Polícia Federal (PF) em Brasília, onde está preso.
— É com grande responsabilidade que confirmo a decisão da maior liderança política e moral do Brasil, Jair Messias Bolsonaro, de me conferir a missão de dar continuidade ao nosso projeto de nação.
A fala de Flávio formaliza um movimento interno que vinha sendo gestado no PL. Segundo relatos, Bolsonaro pediu que o primogênito passe a se comportar como candidato: viajar pelo país, intensificar embates com Lula e organizar palanques estaduais, tarefas vistas por aliados como fundamentais para tentar manter o capital político da família em 2026.
— Flávio me disse que o nosso capitão ratificou sua candidatura. Bolsonaro falou, está falado. Estamos juntos — disse o presidente do PL, Valdemar Costa Neto.
Um presidente de partido do Centrão avalia reservadamente que a candidatura de Flávio não deixa muitas alternativas para as siglas de centro, e que agora o caminho mais provável é que algumas dessas legendas fiquem neutras e foquem em fazer um grande número de deputados federais e senadores.
Nas redes sociais, o presidente do União Brasil, Antonio Rueda, reclamou de articulações envolvendo a eleição de 2026, mas não citou Flávio. Minutos após o senador ter a pré-candidatura confirmada, Rueda disse que “não será a polarização que construirá o futuro”.
Já o presidente nacional do Republicanos, partido de Tarcísio, o deputado Marcos Pereira (SP), disse não ter sido avisado previamente por nenhuma liderança do PL sobre a decisão. Questionado se foi surpreendido, Pereira foi lacônico.
— Não fui comunicado (da decisão). Fiquei sabendo pela imprensa — disse.
No Centrão, a ideia de apoiar Flávio tem sido descartada. A avaliação é que o parlamentar, assim como qualquer integrante de sua família, carrega a rejeição do bolsonarismo. Esses mesmos políticos acrescentam que Flávio não pontua tão bem nas pesquisas eleitorais quanto Tarcísio.
Na sexta-feira, a ex-primeira-dama Michelle manifestou apoio publicamente à pré-candidatura do senador, mesmo após o desentendimento com Flávio sobre a construção de uma aliança do PL com Ciro Gomes (PSDB) no Ceará.
Em publicação nas redes sociais, Michelle escreveu: “Que Deus te abençoe, Flávio nesta nova missão pelo nosso amado Brasil. Que o Senhor te dê sabedoria, força e graça em cada passo, e que a mão d’Ele conduza o teu caminho para o bem da nossa nação”.
Com isso, os planos de aliados da ex-primeira-dama de emplacá-la como vice em uma chapa presidencial ficam, ao menos por enquanto, adormecidos.
Outros pré-candidatos da direita se manifestaram sobre o anúncio de Flávio. O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União), afirmou respeitar a decisão do ex-presidente. Caiado, que vinha tentando se viabilizar com o apoio de Bolsonaro, diz que segue pré-candidato, apesar de ter sido preterido.
“É uma decisão do ex-presidente Jair Bolsonaro, juntamente com sua família, e cabe a todos nós respeitá-la. Ele tem o direito de buscar viabilizar a candidatura do senador Flávio Bolsonaro. Da minha parte, sigo pré-candidato a presidente e estou convicto de que no próximo ano vamos tirar o PT do poder e devolver o Brasil aos brasileiros”, disse em um comunicado.
O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), foi na mesma linha e reforçou que o pleito deve ter “múltiplas” candidaturas. “Quando anunciei minha pré-candidatura ao presidente Bolsonaro ele foi claro: múltiplas candidaturas no primeiro turno ajudam a somar forças no segundo. Então, faz todo sentido o Flávio apresentar seu nome à Presidência. É justo e democrático”, escreveu.
Já o pastor Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, postou que “o amadorismo da direita faz a esquerda dar gargalhadas”. Uma das lideranças evangélicas mais próximas de Bolsonaro, ele ressaltou que não estava falando “nem contra e nem a favor de ninguém”.
No governo Lula, o movimento político é visto com cautela pelo entorno do presidente. Na avaliação de aliados, não dá para considerar que a decisão está tomada e que não haverá reversão nos próximos meses.
O movimento de Bolsonaro foi visto por integrantes do governo como uma reação ao mais recente entrevero público da família do ex-presidente e uma forma de reforçar o projeto da família Bolsonaro.
Dificuldade para alianças
Lula e seu entorno consideram Tarcísio o candidato mais competitivo do grupo adversário, mas não veem eleição fácil com o nome Bolsonaro na urna.
Uma ponderação feita por lulistas é que Flávio, embora seja o nome mais moderado da família, terá dificuldade de juntar o Centrão em torno da sua candidatura. O PT já trabalha para rachar partidos como MDB, PSD, Republicanos e PP nos estados e ter pelo menos parte dos apoios.
O fator Tarcísio também é considerado mesmo na hipótese de ele disputar a reeleição. Uma ala mais pragmática do governo pontua que Tarcísio, ao tentar mais quatro anos no Palácio dos Bandeirantes, fortalece a votação do candidato de direita em São Paulo, maior colégio eleitoral do país.
Já Flávio Bolsonaro puxa muitos votos no Rio de Janeiro, berço do bolsonarismo, o que poderá fortalecer a votação dos Bolsonaro no estado. Por outro lado, avaliam que o nome de Flávio seria um constrangimento a candidatos a governos estaduais de centro-direita no Nordeste, onde há mais defecções para Lula.
Polêmicas e investigações que envolvem o senador
- Rachadinha na Alerj – Flávio Bolsonaro foi investigado por um suposto esquema de rachadinha em seu então gabinete de deputado estadual na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). A rachadinha é quando há o desvio de parte dos salários dos funcionários. Em 2020, o hoje senador chegou a ser denunciado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro, mas o Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou a quebra de sigilo do parlamentar em 2021. Isso enfraqueceu a acusação, levando-a ao arquivamento.
- Loja de chocolates – Em 2018, relatório do Coaf revelou uma movimentação atípica de R$ 1,2 milhão na conta de Fabrício Queiroz, ex-assessor do então deputado estadual Flávio Bolsonaro. Entre 2007 e 2018, o dinheiro, segundo promotores, era lavado com aplicação numa loja de chocolates, num shopping do Rio, que foi alvo de busca e apreensão. O valor estaria ligado ao caso das rachadinhas. Queiroz teria coordenado o esquema. Ao todo, foram identificados 383 depósitos na conta dele.
- Mansão em Brasília – Em 2021, Flávio comprou uma mansão no valor de R$ 6 milhões no Lago Sul, bairro nobre de Brasília. A casa de dois andares tem área de 2.400 m², com 1.100 m² construídos. O senador deu uma entrada de R$ 2,87 milhões e financiou R$ 3,1 milhões pelo Banco BRB em 30 anos. O parlamentar, no entanto, pagou toda a dívida em 2024. Na época, Flávio, que recebe um salário de R$ 44 mil por mês, destacou que é “empresário e advogado”, além de ter a atividade parlamentar.
- Vigília por Bolsonaro – Recentemente, Flávio entrou na mira do STF após postar um vídeo convocando a população a se manifestar contra a prisão domiciliar do pai. A gravação virou uma das justificativas para a decretação da prisão de Jair Bolsonaro, ordenada por Alexandre de Moraes. Segundo o ministro, Flávio “incitou o desrespeito ao texto constitucional, à decisão judicial e às próprias Instituições, demonstrando que não há limites da organização criminosa na tentativa de causar caos social e conflitos”.
Fonte: O Globo


