Derrotado no plenário da Câmara na noite desta terça-feira, 18, o governo Lula vê um “caos jurídico” com a aprovação do texto de Guilherme Derrite (PP-SP) e já articula salvar no Senado o projeto de lei antifacção elaborado pelo Ministério da Justiça.
O sexto relatório elaborado por Derrite em menos de duas semanas foi aprovado por 370 a 110 votos. Os primeiros pareceres foram alvo de críticas, em meio a uma insatisfação generalizada com pontos controversos.
O secretário de Assuntos Legislativos do ministério, Marivaldo Pereira, responsável pela articulação da pasta com o Congresso, diz que quase nada do projeto do governo sobrou no relatório aprovado em plenário.
A avaliação do Planalto é que o projeto, do jeito que está, deve criar um “caos jurídico” a partir do conflito entre diferentes legislações sobre o mesmo tema, o que deve favorecer os réus.
Isso porque a proposta de Derrite cria um arcabouço do zero, o Marco Legal de Enfrentamento ao Crime Organizado, enquanto o projeto do governo apostava em atualizar legislações já existentes, como a Lei das Organizações Criminosas e o Código Penal.
“O relator optou por criar uma estrutura paralela ao combate a organizações criminosas, algo que é extremamente temerário para as investigações em andamento. O efeito imediato vai ser o conflito de normas tratando do mesmo tema. Na dúvida, vai favorecer o réu. Isso vai permitir aos réus interpor sucessivos recursos, atrasando as investigações e favorecendo a prescrição desses crimes”, afirmou Pereira.
Governistas bateram nessa tecla durante discursos na tribuna durante a votação. O líder do PT na Casa, Lindbergh Farias (RJ), disse que o “relator está fazendo uma lambança”. “O que a gente mais vai ter é nulidade em investigações que estão em curso”, afirmou. O deputado Henrique Vieira (PSOL-RJ) falou em “confusão jurídica, uma sobreposição penal”. “Em vez de ajudar, pode atrapalhar e criar nulidades de processo.”
O governo Lula vê atuação do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), por trás do texto construído por Derrite, que se licenciou do cargo de secretário de Segurança Pública de São Paulo para retomar o mandato na Câmara e relatar o projeto do governo. Derrite é pré-candidato ao Senado em 2026.
“O Tarcísio despachou o Derrite para cá com a tarefa de inviabilizar o trabalho do governo federal. Mais uma vez demonstra a falta de conhecimento do Derrite no combate a organizações criminosas. A ministra Gleisi (Hoffmann, da Secretaria de Relações Institucionais) passou o dia alertando que isso criaria um caos jurídico”, disse Pereira.
Fichas no Senado
A aposta do governo agora recai sobre o Senado. Uma das saídas a partir desta quarta-feira será articular um substitutivo na Casa vizinha que traga de volta a proposta feita pelo governo. Mais cedo, o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União-AP), escolheu o senador Alessandro Vieira (MDB-SE) para relatar o projeto.
Questionado mais cedo se o relatório de Derrite teria chance de ser aprovado no Senado do jeito que estava, Vieira afirmou que não sabia. “Não tem texto ainda. Vamos aguardar a quinta versão, a quarta que seja”, afirmou, referindo-se à sucessão de relatórios produzidos pelo deputado – a sexta versão, protocolada após as 18h, acabou sendo votada. Depois da votação na Câmara, Vieira preferiu não se posicionar: “Vamos avaliar o texto com cuidado antes de manifestar qualquer opinião”.
A expectativa de governistas é que a discussão no Senado se prolongue mais do que houve na Câmara, onde versões do relatório chegaram a ser construídas com 24 horas de diferença, sem debate. Eles confiam que o Planalto terá mais chances de criar uma mobilização digital, assim como houve contra a PEC da Blindagem, com mais tempo para levar o tema às redes sociais.
O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), que viajou a Brasília para articular a aprovação do projeto, disse não ver mais chances de o Planalto resgatar o projeto original durante a tramitação no Senado.
“Esse tema já vai para o Senado, e já vai ser aprovado. Não há mais condições nem clima (para alterações). Não vejo como eles tirarem parte do texto. Eu acho que quem vai tirar vai ser o Lula, no veto (a alguns trechos). O texto do Ministério da Justiça já foi arquivado, não caminha mais. O que caminha é o substitutivo do Derrite”, afirmou Caiado.
Fonte: O Globo


