Luana Aguiar Ribeiro começou a trabalhar aos 17 anos com carteira assinada no setor de comércio, em funções como caixa de restaurante e atendente em um hortifrúti. No início deste ano, aos 30, pediu demissão e passou a prestar serviços de forma autônoma de marcenaria, em parceria com o irmão e o marido. Com a demanda em baixa, também começou a fazer faxinas, como diarista. Segundo ela, a mudança compensou e sua renda cresceu 50% em relação aos tempos de assalariada.
— Compensa mais ser autônomo do que trabalhar fichado — disse Luana, acrescentando que agora consegue administrar o tempo livre e ter outras ocupações para ajudar no orçamento. — Antes, ficava presa no trabalho por 12 horas e mesmo ganhando horas extras, o salário ficava em torno de R$ 1,9 mil livre.
Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revela que o caso de Luana não é isolado. Os dados apontam um aumento de 5,6% na renda média dos trabalhadores autônomos no segundo trimestre de 2025 em relação ao mesmo período do ano passado. No caso dos informais — que trabalham sem qualquer tipo de registro — a alta foi ainda maior, de 6,8%. Já o ganho médio de quem tem carteira assinada foi de apenas 2,3%.
A renda média dos trabalhadores sem carteira chegou ao maior nível desde 2012, início da série da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do IBGE, base da pesquisa. Segundo o autor do estudo, Sandro Sacchet de Carvalho, o rendimento de quem tem carteira assinada ainda continua maior em relação aos informais, mas a diferença está diminuindo.
No segundo trimestre deste ano, a renda média dos celetistas foi de R$ 3.171, dos autônomos, R$ 2.955 e dos trabalhadores sem carteira, R$ 2.213.
No mesmo período de 2021, os ganhos dos trabalhadores com carteira superavam os dos autônomos em 25%. Essa diferença caiu para 7,3% no segundo trimestre deste ano.
— A renda dos autônomos e dos trabalhadores sem carteira tem crescido em média mais rápido do que os trabalhadores formais — afirmou Carvalho.
Novas formas de trabalho
O pesquisador do Ipea aponta uma melhoria na renda de informais e autônomos nos últimos anos, mas avalia ainda ser prematuro dizer que essa é uma tendência do mercado de trabalho.
Para o pesquisador, após a pandemia de Covid-19, novas formas de trabalho, como serviços prestados por plataformas, como Uber e iFood, por exemplo, ganharam força, ajudando nesse cenário.
Ele também aponta influência nesse comportamento do regime especial do Microempreendedor Individual (MEI), com contribuição relativamente baixa e cobertura previdenciária.
— O MEI funciona como um atrativo para os autônomos. Há casos de trabalhadores formais que deixam o emprego para virar microempreendedor — mencionou Carvalho.
Procurado, o Ministério do Trabalho não comentou.
Um corte por grupos demográficos revela que os maiores aumentos de renda ocorreram entre jovens adultos (25 a 39 anos), com alta nos rendimentos de 5%. Já os menores ganhos foram observados entre trabalhadores mais velhos (acima de 60 anos) e aqueles com ensino superior.
—Tem crescido a oferta de pessoas com ensino superior no mercado de trabalho constantemente, ao mesmo tempo que a demanda de ocupações que exigem esse nível de escolaridade superior não cresce na mesma velocidade — disse o pesquisador.
Carvalho aponta ainda que boa parte dos trabalhadores com ensino superior acaba exercendo ocupações que exigem nível médio de escolaridade, gerando um efeito cascata na ocupação de cargos. Assim, trabalhadores com ensino médio incompleto ou fundamental, por exemplo, acabam migrando para o setor informal, justamente o grupo em que a remuneração cresce em uma velocidade um pouco maior do que o setor formal.
Para o ex-secretário de Previdência, Leonardo Rolim, as mudanças no mercado de trabalho impõem desafios ao governo, diante dos impactos do envelhecimento da população nas contas públicas. Segundo ele, o MEI precisa ser revisto porque a contribuição de 5% sobre o salário mínimo não cobre as despesas com benefícios previdenciários e isso tende a se agravar no futuro.
Regulamentação
No fim de 2024, a renúncia fiscal referente ao MEI atingiu R$ 6,437 bilhões, aumento de 24,4% em relação ao ano anterior. A contribuição já foi 11% e baixou para 5% no governo de Dilma Rousseff.
Rolim também chama a atenção para a necessidade de regulamentar os prestadores de serviço por aplicativos para oferecer uma proteção à categoria e, ao mesmo tempo, equilibrar as contas da Previdência. A estimativa é que a partir de 2040, esse contingente precisará ser atendido com algum tipo de benefício assistencial por não ter contribuição para a aposentadoria.
— Esses trabalhadores não são empregados e também não são MEIs. São uma classe desprotegida que precisa urgente de regulamentação, com contribuições dos prestadores e das plataformas — afirmou Rolim.
Fonte: O Globo



