A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira a primeira e principal proposta de regulamentação da Reforma Tributária. Com a votação concluída, o projeto segue para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Os deputados votaram primeiro a lista de mudanças feitas pelo Senado que serão mantidas. Foram 324 a favor e 123 contra nesse momento. Depois, votaram a lista de alterações que não foram aceitas. Nessa votação, 328 a 67.
Os deputados promoveram alterações no texto do Senado, aprovado na semana passada. Entre elas, a retirada do saneamento entre os serviços com 60% de redução de impostos e a volta de bebidas açucaradas (como refrigerantes) para o Imposto Seletivo.
O relator, Reginaldo Lopes (PT-MG), também cortou e reduziu benefícios aprovados no Senad, como bolachas, água mineral, veterinários, estacionamentos, veículos elétricos, Sociedades Anônimas do Futebol, cursos de línguas estrangeiras, agrotóxicos, aviação regional e representantes comerciais. Lopes manteve alguns itens adicionados pelo Senado na cesta básica, além a ampliação do cashback para contas de internet e telefone.
O que diz a lei
A lei aprovada hoje é o principal mecanismo para colocar em prática o novo sistema de impostos. O texto traz detalhes do funcionamento dos impostos criados com a Emenda Constitucional. A reforma cria a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de ordem federal, sendo a junção de IPI, PIS e Cofins. E cria o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de competência estadual, que soma ISS e ICMS.
O projeto detalha o funcionamento do cashback, o Imposto Seletivo, de descontos na alíquota e de regimes especiais.
A Câmara recuou de mudanças do Senado para reduzir a alíquota padrão em 0,7 ponto percentual, para algo em torno de 28%. De toda forma, há uma trava na alíquota para evitar que ela passe de 26,5% — o governo terá que propor um projeto, no futuro, para garantir essa determinação.
O valor é alíquota cheia, para bens e serviços sem benefícios fiscais. Outros itens terão redução de 30%, 40%, 60% ou 100% na CBS e no IBS. A ideia do governo é manter a carga tributária.
Nessa fase, a Câmara apenas vota quais mudanças feitas pelo Senado aceita e quais rejeita. Por isso, não haveria como, por exemplo, incluir armas no Imposto Seletivo (com taxa maior).
De modo geral, os pilares da do novo sistema de impostos estão mantidos. Dessa forma, após quatro décadas de discussão, o Brasil caminha para um modelo de Imposto de Valor Agregado (IVA) adotado em centenas de países do mundo.
O sistema prevê a simplificação da cobrança de impostos e a eliminação de acúmulo de tributos ao longo da cadeia.
Os tributos novos começam a ser cobrados em 2026 aspenas com teste simular o valor exato necessário de alíquota para manter a arrecadação atual. A transição para o novo sistema vai de 2027 a 2033. Outros dois projetos, mais técnicos, ainda precisarão ser aprovados palo Congresso Nacional até 2026.
Um segundo projeto de regulamentação, que trata das regras para tributos de estados e municípios sobre propriedades, como o ITCMD e o ITBI está no Senado. Ainda será enviada a proposta que trata das regras para o Imposto Seletivo e suas alíquotas exatas.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), reforçou para os deputados que as únicas opções de votação eram o texto da Câmara ou o do Senado, sem existir uma versão ideal para atender todos os interesses. “
— Em nenhuma hipótese vamos atender a todas as demandas que o Brasil tem, mais ainda em cima das divergências e interesses de grupos, espaços, estados, municípios e situações do manicômio tributário em que vivemos — declarou.
O deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), que relatou a alteração constitucional da reforma tributária, afirmou que o sistema traz simplificação e transparência.
— Quando se fala que vamos ter o maior IVA (Imposto sobre Valor Agregado) do mundo, hoje temos muito mais e não sabemos quanto pagamos — afirmou.
O líder do PT, deputado Odair Cunha (PT-MG), disse que a reforma produz justiça tributária:
— Diminui tributação e alíquota sobre diversos produtos e serviços.
Já o líder do PL, deputado Altineu Côrtes (PL-RJ), criticou a proposta que, para ele, vai gerar o maior imposto do mundo.
Saneamento e bebidas
Uma das principais mudanças feitas no Senado e rejeitadas pela Câmara foi a inclusão do saneamento entre os itens com desconto de imposto. O governo calculou um aumento de até 0,38 ponto percentual na alíquota-padrão — número que é contestado pelo setor. A justificativa dos deputados para retirada do setor da alíquota reduzida é que o mecanismo de cashback, devolução de impostos, já prevê o retorno dos tributos pagos em serviços de saneamento aos mais pobres.
O relator na Câmara ainda retomou as bebidas açucaradas no Imposto Seletivo, item que havia sido retirado do texto pelos senadores. O Imposto Seletivo prevê alíquotas maiores para produtos prejudiciais à saúde e ao meio ambiente.
Medicamentos
Os deputados ainda retiraram a previsão de uma lista genérica de doenças cujos medicamentos seriam atendidos e retomaram a lista detalhada de princípios ativos com direito a imposto zero e com redução de 60%. Dessa forma, praticamente todos os medicamentos autorizados pela Anvisa terão esse desconto.
Serviços com alíquota reduzida em 60%
Reginaldo Lopes também retirou a previsão de alíquota reduzida em 60% os serviços de educação com enfoque cultural, desportiva e recreacional, em línguas estrangeiras e outras formas de treinamento. Permanecendo apenas os serviços de educação tradicional e com enfoque para pessoas com deficiência na alíquota reduzida.
Os serviços de médicos veterinário também foram excluídas da alíquota reduzida em 60% e foram retomados em uma redução de 30%.
Em outra mudança, água mineral e biscoitos foram retirados da previsão de alíquota reduzida em 60%, mudança que também havia sido feita pelo Senado.
Imóveis
A Câmara dos Deputados manteve a alíquota reduzida para o setor imobiliário em 50%, mas retirou a previsão do benefício para estacionamentos.
SAF
O Senado aprovou redução dos tributos sobre Sociedade Anônima do Futebol (SAF) de 8,5% para 5% e o não pagamento do imposto sobre venda de jogadores nos cinco primeiros de criação da empresa, mas Câmara decidiu rejeitar esses benefícios.
Zona Franca
Os deputados de oposição tentaram retirar um trecho que beneficia uma empresa de refino de petróleo na Zona Franca de Manaus. O texto deixa a empresa com os benefícios de demais indústrias da região. A previsão foi acrescentado pelo relator no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), e o relator na Câmara, Reginaldo Lopes, manteve o benefício para a refinaria, mesmo com a oposição do governo. O benefício foi mantido, de acordo com os líderes por um acordo político que envolveu as negociações no Senado.
Técnicos do Ministério da Fazenda reconhecem que o trecho pode causar distorções no mercado de refino de petróleo, já que não tem como garantir que a refinaria da Zona Franca de Manaus vá vender apenas para região. O combustível poderá ser distribuído para outros locais do país, prejudicando a concorrência em outros estados.
Fonte: O Globo