Um novo estudo alerta que o risco maior de morte relacionado ao calor extremo poderá passar dos idosos para os jovens até o fim do século.
Em um cenário em que as temperaturas globais médias aumentem em pelo menos 2,8º C além dos níveis pré-industriais até 2100, as pessoas com menos de 35 anos provavelmente sofreriam mais os efeitos de um mundo em aquecimento do que adultos mais velhos.
A conclusão é de uma pesquisa realizada com base em dados de mortalidade no México publicada na Science Advances.
Através dos dados, os pesquisadores puderam comparar as idades e as datas das mortes com as condições ambientais e calcular a frequência com que a exposição ao calor úmido pode resultar em mortes prematuras.
Os cientistas há muito tempo suspeitam que o calor excessivo em um clima em aquecimento contínuo teria um impacto maior nas populações mais velhas. Surpreendentemente, as altas temperaturas em determinados climas parecem ser uma causa silenciosa de mortes entre os mais jovens.
Fator de letalidade entre os jovens
De acordo com o estudo, entre 1998 e 2019, três em cada quatro mortes relacionadas ao calor no México envolveram pessoas com menos de 35 anos. Em contraste, um número maior de pessoas mais velhas foi responsável por eventos de mortalidade resultantes do clima frio.
Em um cenário em que a população global e as emissões de carbono continuam a crescer, os pesquisadores projetaram um aumento de 32% nas mortes relacionadas às temperaturas mais altas em pessoas com menos de 35 anos até 2100.
Ao mesmo tempo, uma redução quase idêntica nas taxas de mortalidade foi observada nos grupos de pessoas com idades mais avançadas.
A explicação para o motivo pelo qual os mais jovens podem estar sofrendo mais mortes relacionadas ao calor do que o previsto provavelmente se resume a razões sociais. Os mais jovens podem ter mais probabilidade de se expor ao calor, ao ar livre, enquanto um clima mais quente pode reduzir os impactos relacionados ao frio para os idosos.
“Pessoas mais jovens têm níveis de atividade mais altos e são mais propensas a serem expostas ao calor em ambientes de trabalho ao ar livre”, afirmou à DW o pesquisador-chefe do estudo Andrew Wilson, do Centro de Segurança Alimentar e Meio Ambiente da Universidade de Stanford.
Qual o limite do calor excessivo?
A equipe de Wilson também descobriu que a quantidade de exposição ao calor que pode levar à morte é menor do que sugere a literatura científica.
Muitas variáveis ambientais, incluindo temperatura do ar e a umidade, são utilizadas para indicar o estresse por calor, sendo às vezes chamadas de temperaturas de “sensação real” ou “bulbo úmido”. Estudos mais antigos colocam um limite de temperatura para estresse por calor humano em 35º C.
A exposição prolongada ao limite de bulbo úmido, de 35º C, significa, em termos teóricos, que o corpo seria incapaz de resfriar sua temperatura interna, o que resultaria na morte relacionada ao calor.
Esse limite, contudo, foi calculado em condições de laboratório, onde uma pessoa estaria descansando na sombra, sob ventos fortes, encharcada em água e nua, ou seja, dificilmente um cenário realista.
Wilson disse que, em alguns casos, os limites podem estar na casa dos 20º C. Estudos como o dele tentaram levar em conta as condições do mundo real.
“Descobrimos que mesmo em torno de 25º C, já há bastante mortalidade, especialmente entre os mais jovens”, disse Wilson. “Isso provavelmente ocorre porque eles estão se movimentando […] trabalhando ao ar livre […] expostos ao sol.”
Problema global
Embora o estudo analise apenas dados de saúde mexicanos, também fornece uma perspectiva preocupante de um futuro potencial para outras nações na linha de frente de um mundo em aquecimento.
Os especialistas dizem que a mortalidade é uma grande parte do custo total das mudanças climáticas. “Acreditamos que muito menos pessoas morrerão de frio, e que muito mais pessoas morrerão de calor. Acreditamos que a maioria dessas mortes adicionais por calor ocorrerá em países de renda baixa e média”, analisou Wilson.
“A maior redução nas mortes relacionadas ao frio ocorrerá na Europa e na América do Norte, certo? Assim sendo, esse já é um quadro de desigualdade”, acrescentou.
Essas condições já são previstas há muito tempo, levando em conta o ritmo em que as emissões de carbono aumentaram nos últimos anos. O mundo já ultrapassou temporariamente o limite de 1,5º C de aquecimento em relação aos níveis pré-industriais, estabelecido no Acordo Climático de Paris.
Em 2017, estudos previram que até 70% da população da Índia poderia ser exposta a calor insuportável até 2100. Nos últimos anos, os países do Oriente Médio introduziram proibições de trabalho em determinados horários para combater condições extremas de calor.
Fonte: Folha de S. Paulo